terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE A FORMAÇÃO DE QUADROS AGRÁRIOS EM ANGOLA

OBS: Comunicação apresentada ao IV Encontro da AULP. 4 A 8 Abril 1994. Lisboa. Portugal.

RESUMO

Uma das tarefas mais importantes e urgentes a ser realizada nos trópicos é aumentar a produção agro-pecuária. É grande a procura de capacitação e aperfeiçoamento em todos os níveis de actividade, desde o campo ao laboratório. Na maior parte dos países em desenvolvimento, a escassez de recursos financeiros e de quadros técnicos capacitados e as dificuldades de transporte, não possibilita a instalação de centros de formação agrária que permitam a formação de quadros agrários. Nos países em que é possível a instalação e funcionamento dos centros de formação profissional, a formação de quadros no ramo agro-pecuário nem sempre atinge os objectivos preconizados porque não se tem em atenção a diversidade geográfica, ecológica, social, económica e cultural de cada região.

INTRODUÇÃO

O desenvolvimento da agricultura é essencial à economia dos países em desenvolvimento porque para além de fornecer alimentos à população, abastece a indústria em produtos primários e interfere na exportação. A agricultura é a principal fonte de formação de capital que contribuirá para o aparecimento dos investimentos necessários ao desenvolvimento da indústria, dos transportes e de outras actividades dos sectores secundário e terciário.
Os diferentes sistemas de produção agro-pecuários, sistemas auxiliares de abastecimento e mercado e graus de eficácia técnico-económica, correspondem à diversidade geográfica, ecológica, social, económica e cultural de Angola, que variam de região para região, de província para província e às vezes, de município para município.
Esta diversidade tem de ser tida em conta na planificação do desenvolvimento agro-pecuário de Angola, ainda que se considere o desenvolvimento como um processo complexo e gradual. A existência de sistemas de produção tão diferentes, como por exemplo, o nomadismo pastoril e a transumância, agricultura de subsistência, comunidades nas primeiras fases de uma economia monetária, explorações agrícolas familiares e unidades modernas de produção intensiva do sector privado, deve ser encarada com muito realismo.
A elaboração de políticas nacionais em matéria económica e social, com o objectivo de: um melhor equilíbrio entre a população crescente e as suas necessidades alimentares; criação de possibilidades de emprego e investimentos em zonas rurais e o aumento de divisas pelo fomento à exportação, deve ser cuidada para se evitar as distorções ocorridas nos últimos anos.
O estabelecimento de um programa de formação agrária a vários níveis não é uma tarefa fácil para um território extenso, como é o caso de Angola. Só o conhecimento exacto da situação actual e a integração de diversos organismos de responsabilidades específicas na busca de objectivos comuns, permitirá que a agro-pecuária assuma o seu real papel na sociedade angolana.

2 – FORMAÇÃO PROFISSIONAL
A transição da economia rural de subsistência para uma economia de mercado constitui a base da transformação do mundo rural e a formação profissional exerce um papel essencial nesse sentido. Sob formas diversas e com a ajuda de diferentes meios que permitam ao agricultor jovem ou adulto adquirir conhecimentos, a formação profissional ensina as técnicas mais recentes de tal forma que ele possa compreendê-las, assimilá-las e pô-las em prática na própria exploração familiar.
A formação profissional rural deve ter como objectivo a formação de pessoas para o desempenho de actividades futuras como agricultores ou trabalhadores especializados. A formação profissional inserida na realidade do mundo rural, com a diversidade local ou regional, dá aos formandos a possibilidade de uma compreensão mais completa da própria colectividade em que estão inseridos.
Através da utilização de técnicas melhoradoras, agrícolas ou não, a formação profissional deve estimular a fixação à vida rural. Ela deve levar os jovens a considerarem a agricultura e as actividades rurais não tanto como uma forma de sobrevivência mas como uma ocupação que, se praticada de forma adequada, pode proporcionar um nível de vida aceitável dentro do padrão nacional.

2.1 – A FORAMAÇÂO DAS MULHERES E DAS JOVENS RURAIS
As mulheres desempenham um papel indispensável nos trabalhos agrícolas e na gestão da economia familiar, em todos os grupos étnicos do ramo Bantu, exige que a formação profissional lhes seja igualmente dirigida. A mulher necessita de receber os instrumentos teóricos e práticos necessários para assumir responsabilidades no desenvolvimento económico e social das sociedades rurais.
A ocupação da mulher nas tarefas diárias e as suas responsabilidades no mundo rural não permite que se desloque para os centros de formação. Nestes casos a formação e a divulgação agrícola deve ser realizada por meio de curtas acções de formação, reuniões e visitas dos formadores e vulgarizadores aos locais de residência. Este tipo de formação tem custos que as dificuldades económicas dos países em desenvolvimento não permitem suportar, relegando para segundo plano a formação das mulheres.
As mulheres e as jovens rurais devem encontrar nos programas de formação profissional as mais variadas matérias. Para que tais objectivos sejam alcançados é necessário realizar trabalhos de pesquisa para determinar os conteúdos de tais programas e a sua aplicação de acordo com a realidade sócio-económica e cultural do mundo rural de uma determinada região. Tais trabalhos são até agora demasiado incompletos ou inexistentes para constituírem as bases dos programas de formação sistemática.

3 – FORMAÇÃO DE QUADROS MÉDIOS

À semelhança do que ocorre em muitos países em desenvolvimento, em Angola há uma tendência crescente da capacidade técnica estar acima do que na realidade faz falta para o desempenho de muitas tarefas básicas e, por conseguinte, a inclinar-se demasiado para o lado teórico. O ensino eminentemente teórico produz, inevitavelmente, um “desnível cultural” indesejável entre o camponês ou criador de gado, ávidos de receber ensinamentos práticos, para a resolução dos seus problemas diários, e o técnico incapaz de os satisfazer.
A actual formação dos Técnicos Médios do ramo agro-pecuário peca por desconhecer:
- a estrutura social e económica das colectividades agro-pecuárias – a base sociológica da produção agro-pecuária só pode ser ensinada por pessoal dotado de conhecimentos profundos sobre as populações das zonas onde trabalharão os quadros formados. O êxito ou o fracasso dos programas de produção agro-pecuária dependerá do grau de compreensão que exista entre o técnico e o proprietário;
- edafologia e agronomia – o ecossistema deve ser analisado duma forma integrada – relação solo-planta-animal, permitindo a interpretação de factores como clima, solos, pastos, criação de gado, nutrição animal e agentes patogénicos nas distintas regiões do país;
- técnicas de produção animal e vegetal – é fundamental conhecer os métodos de exploração tradicionais e as técnicas de produção mais complexas aplicáveis sobre uma base económica mais realista.

4 – CONCLUSÕES
Há a necessidade de se redefinir a estrutura dos cursos agrários para que os técnicos possam, também, responder com urgência aos problemas que lhes são colocados por sistemas tradicionais de produção das várias regiões de Angola.
É urgente a concepção de um sistema mais dinâmico de capacitação e ensino no ramo agrário, que satisfaça as necessidades de cada região e a elaboração de uma estratégia do quadro profissional suficientemente flexível para que possa adaptar-se à evolução contínua da realidade agrária.
É evidente que as dificuldades de planificação das estruturas dos cursos agrários são enormes, principalmente quando o conhecimento real e actual dos sistemas de produção é reduzido ou nulo.

Agradecimentos
O autor agradece à Associação das Universidades de Língua Portuguesa (AULP) e à Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica (JNICT) de Portugal o apoio prestado à realização do presente trabalho.

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